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Ideias sobre "O Lugar" em Arquitectura


Ricardo Guerra

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Gostava de ver, iniciando a discussão sobre a ideia contemporanea de "Lugar", as opiniões dos meus colegas sobre este tema que ultimamente tem suscitado das mais diversas dúvidas, conduzindo a vários tipos de atitude de ver, saber e fazer Arquitectura. Dou o mote de partida confrontando simplesmente dois grandes autores, Alvaro Siza Vieira - "Imaginar a Evidência" e Rem Koolhas - "Delirous New York" balizando talvez assim em minha opinião as ideias opostas sobre este tema que julgo serem mais bem fundamentadas. Porque de facto acho que das interpretações do Lugar nasce uma obra.

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Se pensarmos que o espaço não termina no objecto, mas continua no espaço envolvente, no jardim, no bairro, na cidade, no território, e que o objecto constitui apenas parte dessa realidade mais abrangente, a sua integração no lugar é "condição sin ne qua no" para a criação de um ambiente arquitectónico, isto é, de fruição, de sedução, belo. A beleza está na relação, não no objecto isolado. Uma inovação dos "neo-realistas" (távora: casa de ofir, Siza, etc) era exactamente constituirem os espaços de acesso como zonas de passagem, não como volumes estáticos, como faziam os modernistas radicais (Pires Martins, Athouguia, etc). Mas a relação com o lugar não é apenas física como tb cultural: não é possível compreender o enorme impacto que teve a Torre Velasques, dos BBRV (?), sem ter passeado um pouco pela cidade, e reconhecer como aquela imagem de torre que alarga em cima tem uma profunda relação com a arquitectura da cidade. Tb Aldo Rossi procurava trabalhar não só com a razão (na escolha tipológica), como com o subconsciente, ao buscar imagens de referencia: aqueles cones, aqueles pilares... E que dizer do Teatro del Mundo? Supostamente nem sequer está implantado em nenhum lado, mas num barco. Contudo é uma obra que só faz sentido em Veneza...

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Obrigado Rui pela indicação do livro, assim que puder vou dar uma vista de olhos. Poderemos pensar sempre em espaço interior sim e de que o lugar nunca será indissociável desse "interior", a rua, as fachadas, os jardins, as praças, mas acho tambem de que assim sendo, hoje, o lugar mais do que nunca não poderá ser entendido no sentido fenomenologico, pertencente a uma natureza que dá a informação necessária para a concretização da "obra" arriscando-nos a admitir do ponto de vista teorico de que a arquitectura estaria pre- determinada pela natural estrutura dos lugares. Hoje a informação e os contextos são completamente diferentes e por vezes difusos, que facilmente nos indusem em erro. Considerando a arquitectura, arte, ela terá sempre o poder de ordenar e de impor a sua regra sobre o mais caotico enredo de relações, reinventando novos contextos e criando novas relações. Comparando a escola de aalto que posteiormente, viria marcar a arquitectura moderna portuguesa, com le corbusier vemos atitudes teoricas completamente diferentes e distintas. Uma de que para cada lugar haverá "a obra" unica e magnifica no seu explendor que para alem de o respeitar enaltece-o e qualifica-o. Outra de que a arquitectura terá meios para determinar um conjunto de regras que aplicadas a cada projecto de um modo geral, respeitará cada lugar especifico.

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A questão é deveras interessante, não sei é se consigo cingir-me exclusivamente ao tema do tópico. Como dizes, a obra não pode nascer do lugar, mas sim da INTERPRETAÇÃO que é feita do lugar, ou seja, engendrada por uma consciencia, e subconsciencia, do arquitecto. Mas ele tem de existir para que haja uma interpretação. Há tb ainda uma coisa chamada Programa, de maneira que não há possibilidade das opções que tomamos sobre a forma recairem exclusivamente na interpretação do Lugar. Queremos que uma casa pareça uma casa, e que tal edifício público pareça o que é... Depois quando falamos no Corbusier é preciso especificar qual, porque há dois: o antes e o pós guerra. E quando foi lá para as Indias, alguns princípios deixaram-se ficar pelo caminho. Essa ideia de uma "arquitectura genérica" sempre me fez confusão, e estou convicto de que foi um enorme mal entendido histórico. Esse tema é, pra mim, muito abrangente. É preciso vê-lo quase com lente de filósofo e/ou fenomenólogo, que não possuo, mas ficarei atento.

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Concordo, da ideia de lugar poderemos falar sobre quase tudo em arquitectura mas poderemos especificar o tema ao contexto onde se insere cada obra, ou seja, definindo o lugar. Acho que poderemos definir o lugar como, a relação ou o que existe da relação entre as "coisas" que o limitam ou o definem. Para mim teremos de estar sempre á volta, para fazer arquitectura, de três factores essenciais:- Lugar- Matéria-Programa Sobre materialidades e programa parece-me de que não poderemos definir regras de aplicação ou uso pois estariamos sempre de alguma maneira a limitarmo-nos e a castrar a imaginação e poder criativo de qualquer um. Mas sobre o lugar que é algo "exterior" á obra poderemos chegar a várias conclusões que hoje e sempre marcaram as várias linguagens e até escolas de arquitectura no mundo inteiro. Uma das minhas convicções, admitindo erro possivel, é de que, custa-me a acreditar de que uma obra de qualidade dependa de um lugar de qualidade, se é que poderemos falar de lugares bons ou maus visto que hoje chegamos á definição e identificação dos "não lugares". Ora admitindo a existencia de não lugares e de lugares, e de que segundo a escola do porto, o lugar pre-destina a obra de arquitectura no sentido de que é deste que ela terá de partir para ser legitimada como tal, facilmente poderia afirmar de que uma obra de arquitectura dependerá sempre e em primeiro lugar se o contexto onde se insere, pelo menos, se elevar a lugar. Por outro lado a mesma escola, diz-nos que, para se elevar uma construção qualquer á obra de arquitectura, ela terá forçosamente de construir um lugar, (construir a relação entre as "coisas" que o limitam ou o definem") o que neste ponto eu concordo senão não estava a acrescentar nada de novo. Mas parece-me já, que existe um paradoxo nesta ideia de lugar e obra. Por um lado admite-se de que do lugar nasce a obra, por outro, esta só é apreendida se construir um novo lugar. Como ou em que estado fica o Lugar Existente antes da Obra se passa a ser outro "Novo" ?

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"Mas parece-me já, que existe um paradoxo nesta ideia de lugar e obra. Por um lado admite-se de que do lugar nasce a obra, por outro, esta só é apreendida se construir um novo lugar.

Como ou em que estado fica o Lugar Existente antes da Obra se passa a ser outro "Nov
o" ?



É porque não havia lugar antes da obra - senão na visão do arquitecto. Ou melhor: o arquitecto "encontrou" o lugar a partir de algumas premissas que já existiam naquele sítio. Semi-construiu o lugar.

Veja-se a Casa Malaparte, do Libera. As piscinas de Leça do Siza. São semi-realizações de lugares que já lá estavam. Quando as referencias são poucas, então há que criá-las: vem-me à cabeça a Igreja de Marco de Canavezes: os dois "Us" contrapostos com a vista do vale ao fundo gera um objecto capaz de se autoreferenciar na nossa memória profunda - criou-se o Lugar! Neste último caso houve necessidade de um pouco mais de intervenção do que nos primeiros dois. E ainda assim não ficou completo, há ainda espaço para algo mais de futuro, que venha contribuir ou destruir aquele lugar recém nascido.

Não há paradoxo nenhum, apenas confusão derivada da forma como utilizamos as palavras - retórica.
Não há perigo pior para quem quer realmente aprender, do que a retórica, o sofismo. Perdem-se horas preciosas só para desvendar a informação do meio da palha...
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Concordo com a ideia de que em qualquer nova obra se "semi-constroi" parte do lugar que já existia criando um novo. No entanto em minha opinião existem projectos que servem aquele lugar e só esse mesmo lugar e outros que da mesma forma que "respondem" ao lugar para onde foram pensados ainda teem a capacidade de poderem ser utilizados como soluções "tipo" para outros lugares. Vejamos dois projectos de contraste por exemplo e que da mesma forma poderiam responder a outros lugares de caracteristicas comum como a casa da cascata do Wirght e a Villa Savoy do Corbusier. Uma, a primeira, quase que nasce da mesma forma que cresceu no tempo o lugar e a outra a segunda, pousa no lugar de forma magistral como se sempre la existisse. Não será dificil imaginarmos a potência destes dois projectos num qualquer outro lugar mas é-me dificil acreditar nos muitos dos projectos que hoje se fazem em que se tenta assegurar como satisfatorio de que foram pensados para "ali". Quero com isto dizer que de um certo modo podemos concluir de que existem projectos "atitudes" que respondem ao lugar "constexto" onde se inserem e nada mais que isso ainda que a tarefa seja dificil e de muito apreço para quem o consegue, mas que existe a possibilidade de pensarmos em sistemas de pensamento que nos possibilitam o suporte para produzirmos soluções tipo que com a devida adaptação respondem igualmente ao lugar onse inserem. E até porque se assim não fosse, não querendo confundir linguagem em arquitectura com método, em teoria se para cada lugar em arquitectura só pudesse existir uma obra dita "arquitectura" unica e exclusiva, esta não se poderia repetir em nada a outra num outro lugar e nos mais variados mestres e sobretudo os actuais facilmente percebemos de que isso nao se verifica.

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hum... Até certo ponto penso que é impossível pensar num objecto sem um contexto, por mínimas que sejam as referencias: há sempre a orientação solar, a noção de uma frente urbana priveligiada, se é em banda ou isolada, tem de haver qualquer coisa! Na Obra Completa do Corbusier, 1º volume, na Ville Savoye, temos lá um pequeno esquiço onde ele pensou num pequeno bairro de vilas savoyes para a Argentina. E vemos nas implantações que a casa não prescinde de certos caracteres de implantação: ocupando o centro da parcela, rodeada de verde e uma distancia segura dos vizinhos; vemos ainda que as vias de acesso são uma ramificação progressiva, em beco sem saída, etc, etc. Há uma espécie de "germe" de implantação implícito no projecto "tipo" inicial. E penso que mesmo qualquer projecto, por mais "genérico" que pareça ser, tem sempre, nem que seja no inconsciente do arquitecto, uma ideia de lugar e de clima implíctos. Talvez seja lícito pensar que os projectos "tipo" não são bem arqutiectura, mas um passo no sentido da arquitectura, uma vez que lhe falta uma coisa essencial: o sentido que lhe confere a implantação.

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Sim estamos de acordo com o facto do trabalho de implantação e as preocupações que envovem conferirem ao "objecto" a particularidade de integração naquele lugar. De facto este é um dos pontos de que não puderemos fugir para a produção de arquitectura. Mas admitindo isto, tambem poderemos admitir o estudo de tipologias de lugar e correspondentes tipologias de projecto que com a metedologia necessária á sua implantação respondem de um modo geral aos lugares em geral. Lembro-me dos textos de Pedro Gadanho que tinha qualquer coisa a ver com isto, "projectos especificos para os ugares em geral" e projectos gerais para lugares especificos" que tocam muito o que estamos a falar penso eu. Se restringirmos o reconhecimento do lugar ao lugar geometrico aí então a possibilidade de encontrar geometrias tipo de lugares é maior. É claro que as condicionantes de localização e da região em causa como já desde vitruvio sabemos, não poderão ficar de parte não possibilitando assim a produção de objectos encerrados em si mesmo. O que dizer nas emergentes propostas de casas modelares e de propostas pré fabricadas em que a unica preocupação é mesma a implantação que muitas vezes não fazem a adaptação necessária para o lugar em termos de arquitectura.

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(isto parece ping pong...)


Transcrevo algumas reflexões pelas quais passei, já alguns anos, sobre a fenomenologia do lugar, tendo como base o livro Genius Loci, de Norberg-Schulz (já muito visto e revisto...) - não muito contemporaneo, infelizmente, mas nem por isso menos válido.

1.

O que é que faz o fenomenólogo? O fenomenólogo analisa o espaço, ou o lugar, do ponto de vista do ser humano.


Para ele o lugar não é apenas um objecto tridimensional – vamos chamá-lo de espaço concreto - como é tb um “objecto” percepcionado do ponto de vista do Homem – vamos chamá-lo de espaço vivido - e como tal o espaço deixa de ser apenas algo indiferentemente diferenciável (com base num referencial cartesiano, por exemplo) e passa a ter muitas dimensões, incluso uma dimensão poética (“a poética do espaço”): porque 1 metro na vertical é muito diferente de 1 metro na horizontal, como é muito diferente esse metro no espaço interior ou no espaço exterior; o espaço vivido engloba ainda a noção de carácter do lugar (o genius) (...), etc, etc, etc.


Portanto o fenómeno do lugar, ou qualquer fenómeno, só o é relativamente à percepção empírica vivencial que temos desse determinado acontecimento ou objecto. Dai a frase: o Homem é a medida de todas as coisas.

Daqui torna-se evidente que ele atribui qualidades ao espaço em função de si próprio: “a habitação deve ser protectora; o local de trabalho, eficiente; o Teatro festivo; a Igreja solene. “

Concluimos ainda que:

1º: “qualquer lugar devia ter a capacidade para receber diferentes conteúdos, naturalmente com alguns limites.
2º: um lugar pode ser interpretado segundo diferentes perspectivas.
3: O lugar é mutável, mas o seu “genius loci” pode ser conservado: significa concretizar a sua essencia em cada novo contexto histórico! A história de um lugar devia ser a sua auto-realização.”

(Passaram-se dois capítulos do livro, e nem foi preciso avançar mais, para que já uma série de equivocos que surgiram ao longo da nossa conversa serem desfeitos!)



Daqui defendo que partir do Lugar para concretizar um projecto de arquitectura não é algo assim tão imediato como aparentas fazer crer...

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"o estudo de tipologias de lugar e correspondentes tipologias de projecto que com a metedologia necessária á sua implantação respondem de um modo geral aos lugares em geral"
Tenho de confessar que apenas folheei esse livro do Pedro Gadanho, arquitecto que, aliás, admiro pela obra que fez com a aldeia da luz. Ai está uma obra que não se limitou a repor a circunstancia anterior como tb procurou adaptá-la... (uma das exigencias da população foi de transladar o cemitério tal e qual!).
E confesso tb que o tema do livro é absolutamente actual! O que mais fazemos são projectos abstractos para clientes que não podemos conhecer, e se por acaso o construirem noutro local, é natural que aconteça. Mas essa realidade é algo que me constrange e aborrece sobremaneira, e contra a qual tento lutar ou fugir.

"casas modelares e de propostas pré fabricadas em que a unica preocupação é mesmo a implantação que muitas vezes não fazem a adaptação necessária para o lugar em termos de arquitectura"

Outra coisa não seria de esperar. Pra não falar da adaptação que o usuário tb terá de fazer, porque tb ele tem de moldar os seus hábitos a um objecto que não só não foi pensado para ele, como não foi pensado para receber diversas actividades, e possuir uma certa ambiguidade/flexibilidade naturalmente necessária...

Falando de tipologias de lugar, não existem, ou existem no sentido em que estão associadas a determinadas culturas de habitar. Existem arquétipos, como a casa gótica, por exemplo, que existe em toda a europa: a casa desenvolvida entre dois longos muros de propriedade, edificada à face da rua com quintal atrás. As unidades de habitação de marselha inspiram-se neste Tipo de habitação, e tb a casa citroen vai buscar este arquetipo.

Há muitas ferramenteas de que o arquitecto pode servir-se, mas frente de uma situação concreta, um cliente concreto, um local específico, só a sensibilidade o poderá auxiliar
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Obrigado desde ja pela tua atenção, mas em muito me ajudas a tirar de facto algumas das minhas duvidas, e ajudaria quem tiver estas conversas, pelo menos comigo, porque é algo que acho muito importante sobretudo nos dias que correm. Não pretendo ser fundamentalista sobre nenhuma das correntes teóricas comtemporaneas, só que apenas duvido de que precisemos assim tanto da questão do lugar para fazer arquitectura, simplesmente pela razão de que o lugar hoje é e sempre será mutável. Julgo certo dizermos de que o lugar definse-se por um contexto onde o tempo e a sua história estão presentes mas acho que pela geometria poderemos com precisão defeni-lo reconhecendo-o. O filosofo, o poeta, o musico e os artistas em geral diferem do arquitecto, acredito eu, pela unica razão de que é ele "arquitecto" o único capaz de reconhecer uma geometria existente e traduzi-la em sentimento, espaço e poesia. Por esta razão, dizia de que se cinrcunscrevessemos o problema do lugar e do seu reconhecimento á geometria encontrariamos aí, talvez a solução. Não pelas razões de Eisemen nem pelas de Koolhas mas simplesmente por ter a certeza de que a Arquitectura só o é pela tradução de ideias e conceitos em geometria.

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Obrigado eu pela oportunidade de discutir e por em dia assuntos que tb me interessam. Em resumo, e pelo contrário, penso que hoje precisamos da "questão do lugar" mais do que nunca - os programas são instáveis, tudo é tão instável, que das únicas coisas a que nos podemos agarrar para fundamentar as nossas opções em projecto é mesmo no lugar e na cultura a quem o projecto servir. Tenho um lugar. Se pretendo fazer uma casa, procuro ver onde está a íntimidade natural desse lugar. Se pretender fazer um edifício público, talvez procure ocupar um local de exposição natural do lugar. Colaborar com o lugar é meio caminho feito! São só vantagens! Mas não há um projecto ideal para cada local, visto que depende tb do programa. Percorremos o país e assistimos a inúmeros casos de casa de emigrante que cortaram "à faca" a encosta só para poderem instalar-se numa plataforma horizontal à cota da rua... Lotemanetos inteiros feitos em cima do joelho, quando poderiam inclusivo ganhar dinheiro se parassem para pensar um pouco... "Arquitectura é geometrizar" (li isto algures). Geometria materializada, faltou dizer... E por ai fora, nunca mais me calava. Bom, foi um prazer

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  • 9 months later...

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